COMUNICADO
25.outubro.2023
É unânime que a proclamada generalização do modelo B e a revisão necessária do DL (Decreto-Lei) das USF (Unidades de Saúde Familiar) foram uma lufada de ar fresco, face à estagnação em que se encontra a reforma dos CSP (Cuidados de Saúde Primários) nos últimos anos, após a intervenção da Troika.
Soube-se ontem que o Presidente da República terá já promulgado o novo decreto-lei das USF. Não se conhece, ainda, o teor deste decreto-lei, mas a sua publicação virá esclarecer muitas das dúvidas que se têm levantado nos últimos meses.
É, no entanto, preocupante a falta de confiança dos profissionais de saúde com todo este processo, que tem crescido com o arrastar das negociações e com o efeito de bola de neve no que toca à inquietação dos profissionais com as suas condições de trabalho, as perspetivas de carreira e o futuro no SNS (Serviço Nacional de Saúde).
Esta falta de confiança tem também sido alimentada por dúvidas sobre o impacto da nova legislação nos vencimentos dos profissionais.
Parece claro que o vencimento irá aumentar para todos os grupos profissionais que irão passar de USF A e UCSP para USF B, algo que, no entanto, deveria estar a acontecer desde os tempos da Troika (2011) se não tivessem sido implementadas e mantidas até agora as quotas administrativas para esta passagem. A abolição destas quotas é uma grande vitória da USF-AN e deste governo, e será a medida que mais problemas poderá resolver, nomeadamente a atribuição de equipas de saúde familiar a exercer em condições otimizadas a mais residentes em Portugal. Os vencimentos ligados à carreira de cada grupo profissional também devem ser valorizados, de modo a permitir que a opção por se trabalhar numa USF B seja uma escolha por um modelo de trabalho diferente, mais satisfatório. Esta evolução também obrigará a que o modelo B se vá tornando cada vez mais atrativo, como aconteceu no início da reforma.
Importa esclarecer que a diferença de vencimento entre as USF e as UCSP representa o pagamento mais justo do aumento de responsabilidade e trabalho associado a uma USF. A verdade é que numa USF, ao contrário dos modelos de trabalho anteriores, os profissionais são responsáveis por listas maiores, cumprimento de objetivos mais exigentes e mais atividades como a gestão da unidade, a formação dos seus profissionais ou a intersubstituição dos profissionais em falta, o que representa centenas de horas de trabalho adicionais e um maior impacto na vida pessoal dos profissionais.
Para os profissionais já em USF B, o que tem sido anunciado passa pela reposição parcial do que se foi perdendo desde 2007 e, para já, apenas para médicos, faltando as atualizações para os restantes grupos profissionais, o que leva a problemas dentro da equipa.
De facto, comparando os vencimentos de hoje com os de 2007, quando começaram a maior parte das USF, (apenas a parte da remuneração-base, que é a parte que vai sofrer alterações mais substanciais, a fazer fé nas propostas apresentadas anteriormente), temos a seguinte realidade …
Quanto aos Médicos de Família:
Remuneração Base | 2007 | 2023 | Diferença para remuneração de 2007 (%) |
Assistente 35h em Dedicação Exclusiva atual (referência para a remuneração-base nas USF) | 2.450,90€ | 2.684,59€ | 9,5 |
Salário Médio dos trabalhadores por conta de outrem A | 806,1€ | 1.082,8€
(2021) |
34 |
Como ficaria a remuneração de assistente 35hDE tendo em conta a atualização pela inflação (para valores de 2023) B | 3 237,93 | 32,1 | |
Como ficaria a remuneração de assistente 35hDE se tivesse uma valorização igual à do salário médio dos trabalhadores por conta de outrem desde 2007 até 2021 (+ 34%) | 3.284,20€ | ||
Dedicação Plena (futuro DL) Lista de 1917 UP | 3.024,25€ | 23,4 |
*(montantes ilíquidos, em euros) (A – ligação aqui; B – Utilizada esta fórmula do INE para o cálculo – ligação aqui)
Quanto aos Enfermeiros de Família
Remuneração Base | 2007 | 2010 | 2023 | Diferença p/ 2007 (%) | Diferença p/ 2010 (%) |
Enfermeiro 35h | 980€ | 1.201€ | 1.280,72€ | 30,6 | 6,6 |
Como ficaria a remuneração do enfermeiro 35h tendo em conta a atualização pela inflação (para valores desde 2010 até 2023)B | 1.522€ | 26,7 | |||
Como ficaria a remuneração do enfermeiro 35h se tivesse uma valorização igual à do salário médio dos trabalhadores por conta de outrem desde 2010 até 2021 (+ 20,4%) | 1446€ |
*(montantes ilíquidos, em euros); (seguindo-se as mesmas aplicações e grelhas do quadro anterior); no caso dos enfermeiros, comparou-se com 2010 porque neste ano houve um reposicionamento na tabela salarial.
Quanto aos Secretários Clínicos
Remuneração Base | 2007 | 2023 | Diferença p/ 2007 (%) |
Secretário Clínico | 683,13€ | 869,84€ | 27,33 |
Como ficaria a remuneração do Secretário Clínico tendo em conta a atualização pela inflação (para valores desde 2007 até 2023)B | 902,4€ | 32
|
|
Como ficaria a remuneração do Secretário Clínico se tivesse uma valorização igual à do salário médio dos trabalhadores por conta de outrem desde 2007 até 2021 (+ 34%) | 915€ |
*(montantes ilíquidos, em euros); (seguindo-se as mesmas aplicações e grelhas do quadro anterior)
Assim, à pergunta “sobre o que é necessário para restabelecer a confiança dos profissionais das USF”, respondemos que, neste momento, só o conhecimento da proposta do Decreto-Lei. Esta proposta deve:
- ter todo o articulado e portarias previstas para 2024 (e garantias para 2025);
- contemplar medidas de valorização remuneratória adicionais para médicos, enfermeiros e secretários clínicos, com um aumento da percentagem fixa remuneratória relevante para todas as posições remuneratórias (uma aspiração que traria segurança a muitos dos profissionais dos CSP);
- estabelecer um modo de cálculo da remuneração de médicos, enfermeiros e secretários clínicos segundo os mesmos princípios e em que a parte variável da remuneração continue a poder ser calculada com equilíbrio entre a dimensão da lista de utentes e o cumprimento das atividades específicas porque se potenciam mutuamente; Indexar os suplementos a um referencial para permitir atualizações;
- manter as atividades específicas (AE) como garante do cumprimento das boas práticas assistenciais (que tem tido tão bons resultados), sendo remuneradas de acordo com o número de utentes em que se consegue cumprir as mesmas, como até agora, devendo-se considerar a necessidade de atualizar aquilo que são boas práticas para estarem alinhadas com a evidência internacional; uma opção, como o IDE (Índice de Desempenho da Equipa) que estava nas propostas anteriores, que depende da cobertura de uma percentagem da população pode levar à estratégia de se ter uma população menor para se conseguir atingir a meta mais facilmente; enquanto que a estratégia anterior das AE, se se tiver populações maiores, haverá maior hipótese de ter mais utentes a cumprir;
- continuar a estabelecer o IDG (Índice de Desempenho Global), que pode ser renovado, como garante de acesso e manutenção em USF e critério para atribuição de incentivos institucionais; neste, como até agora, podem estar contemplados indicadores relacionados com os custos ou utilização dos serviços de urgência hospitalar e continuar a ter os bons resultados que as USF B têm demonstrado (melhores resultados nestes indicadores do que as USF A e UCSP (Unidades de Cuidados de Saúde Personalizados) para todos os indicadores e todos os últimos 7 anos).
Deve, ainda, ser:
- publicado um estudo de impacto com folhas de vencimento reais em setembro 2023 e como vai ser em janeiro 2024 em cada posição para médicos, enfermeiros e secretários clínicos para as USF B e para quem se quiser manter nos outros enquadramentos; na parte variável relacionada com a qualidade dos cuidados deve ter várias combinações por ex. 0, 1 e 2 e para a dimensão de lista 3 pontos (mín., intermédio e máx.), no fundo, 9 simulações para cada situação; e, ainda, o que acontece em caso de baixa e aposentação.
- garantida a abertura de concursos para a categoria de Enfermeiro Especialista de todos os enfermeiros detentores do título de Especialista em Enfermagem de Saúde Familiar a exercer em contexto USF ou UCSP; e simplificar o processo de atribuição do título de Especialista em Enfermagem de Saúde Familiar, valorizando a experiência profissional de enfermagem em USF/UCSP;
- valorizada a atividade do Secretariado Clínico, com a saída do despacho do perfil de competências e funções já proposto anteriormente com o contributo da USF-AN, com possibilidade de criação de estrutura formativa para o efeito;
- resolvido o impasse da atribuição dos incentivos institucionais, garantindo o seu pagamento como promotor da autonomia e garantia de formação e diferenciação das equipas, com efeitos retroativos.
Nesta fase, importa tornar pública a proposta do DL (com as suas portarias) e a nova Portaria da contratualização com os incentivos para que se possam esclarecer profissionais e população.
A Direção