Até quando vamos continuar a falhar no recrutamento das Equipas de Saúde Familiar?

COMUNICADO

4.outubro.2024

Depois do falhanço no mais recente recrutamento de novos médicos de família para o SNS, decide-se voltar ao modelo inicial de contratação para estes profissionais, mas insiste-se em erros que vão, novamente, colocar em causa todo o processo e adiar a resolução do problema da falta de equipas de saúde familiar em Portugal.

Na tentativa de resolver esta problemática, a USF-AN manifesta a sua profunda preocupação relativamente à recente comunicação enviada pela ACSS às Unidades Locais de Saúde, no âmbito da identificação de vagas para o próximo Concurso de Colocação de Médicos de Família.

A referida comunicação da ACSS inclui a solicitação de preenchimento de uma declaração prévia, pela qual as equipas das USF são pressionadas a abdicar do seu direito de escolha dos profissionais que integrarão as suas equipas. Esta imposição não só desrespeita a autonomia das USF, consagrada no Decreto-Lei n.º 298/2007, e sucessivamente reafirmada nas várias atualizações legais, inclusive no mais recente diploma Decreto-Lei n.º 103/2023, como também coloca em causa os princípios fundamentais da gestão das equipas multidisciplinares, cuja eficácia depende da capacidade de selecionar de forma criteriosa os seus elementos.

Ao vincular a abertura de vagas à assinatura desta declaração, a ACSS coloca as equipas das USF perante um assédio inaceitável: ou abdicam do seu direito de escolha ou como consequência, não terão direito às vagas necessárias para assegurar o acesso dos utentes aos cuidados de saúde primários. Esta situação configura uma forma de pressão inapropriada que compromete a qualidade da prestação de cuidados, uma vez que a seleção de profissionais é um fator determinante para a coesão e funcionalidade das equipas e um direito destas equipas previsto na lei.

A USF-AN alerta que esta medida viola o espírito de autonomia que sempre orientou o funcionamento das Unidades de Saúde Familiar, prejudicando a sustentabilidade do modelo com provas dadas de sucesso nos cuidados de saúde em Portugal. O papel das USF na promoção da saúde, prevenção da doença e gestão de doentes crónicos exige um ambiente de trabalho baseado na confiança, na liberdade de escolha e na corresponsabilidade na decisão sobre os recursos humanos que as integram.

Exigimos, assim, que seja imediatamente cessada qualquer forma de coação sobre as equipas das USF e que o procedimento de seleção de médicos de família, ou qualquer elemento de outro grupo profissional, respeite os direitos das unidades, conforme consagrado na legislação aplicável.

Face a esta situação, e de modo a garantir o cumprimento dos princípios de autonomia e legalidade, a USF-AN recomenda a todas as USF que, em vez de assinar a declaração proposta pela ACSS, utilizem uma declaração que respeite a legislação em vigor e os direitos das equipas.

A Declaração proposta pela USF-AN, adaptável a outro grupo profissional, a preencher pelas USF depois de aprovada nos seus Conselhos Gerais das USF, poderá seguir o seguinte modelo:

A USF-AN alerta, ainda, que as Unidades Locais de Saúde estão a impor dificuldades às USF quando estas propõem mobilidade de profissionais, por vezes mesmo dentro da própria Unidade Local de Saúde, para poderem compor as suas equipas e assim prestarem os cuidados com a qualidade que as populações necessitam. O modelo atual das Unidades Locais de Saúde não veio resolver este e outros problemas, apenas os tem agravado.

Uma última nota, reveladora da cultura subjacente, os cuidados de saúde primários nesta carta da ACSS são denominados “cuidados de saúde pré hospitalares”, não deixando dúvidas sobre o preconceito que está na génese deste tipo de estratégia.
Até quando teremos de aguentar este tipo de assédio?
A USF-AN continuará a acompanhar esta situação de perto e tomará todas as medidas que se revelem necessárias para salvaguardar os direitos e a autonomia das Unidades de Saúde Familiar, em prol da qualidade dos cuidados prestados aos cidadãos.

É com Cuidados de Saúde Primários fortes que se vão resolver os problemas do SNS!
A Direção

* Comunicado em pdf