Comemorar o 12 de outubro: 20 anos da Missão para os Cuidados de Saúde Primários que apoiou as USF

COMUNICADO

11.outubro.2025

Em 2025 comemoram-se 20 anos da Resolução do Conselho de Ministros n.º 157/2005, de 12 de outubro que determinou a criação da Missão para os Cuidados de Saúde Primários (CSP)[1]. Pode-se discutir qual é o momento mais importante para a reforma dos CSP de 2005. No entanto, quando se cria uma estrutura de missão, o sinal que se dá é que se quer, efetivamente, que a reforma aconteça. Os CSP estiveram verdadeiramente no coração do sistema de saúde, eventualmente, apenas por duas vezes, neste que levou às USF (Unidades de Saúde Familiar) e, em 1971, com o Decreto-Lei n.º 413/71, de 27 de setembro que implementou os centros de saúde de “primeira geração”.

Em 2025, a USF-AN celebra não apenas 20 anos de uma estrutura de missão, mas também duas décadas de uma visão que transformou o quotidiano dos cuidados de saúde primários em Portugal.

A reforma dos cuidados de saúde primários de 2005, assim como a de 1971 (os centros de saúde subsistiram desde essa altura até 1 de janeiro de 2024, quando começaram as Unidades Locais de Saúde – ULS) têm sido das mais bem-sucedidas reformas dos serviços públicos das últimas décadas. Fizeram evoluir os cuidados, alteraram profundamente o modo como os profissionais estão nos serviços, permitiram o acesso a serviços de saúde essenciais, melhoraram a relação entre cidadãos e equipas de saúde e otimizaram resultados. Portugal ficou com CSP que são alvo da atenção internacional pela sua singularidade e pelos resultados que conseguem alcançar.

O Observatório Europeu de Políticas e Sistemas de Saúde e a OCDE em 2017, e novamente em 2021 e 2023 reconheceram isso mesmo quando evidenciaram a taxa de hospitalização evitável de Portugal – das mais baixa da União Europeia para a diabetes, asma, DPOC e insuficiência cardíaca – e concluíram “que estas doenças estão a ser geridas com eficácia ao nível dos cuidados de saúde primários e que estes são de boa qualidade” para além das baixas taxas de mortalidade evitável e tratável, muito melhores que a média da União Europeia e do que países, como a Áustria, Alemanha ou Finlândia, que gastam muito mais em Saúde[2].

A Entidade Reguladora da Saúde também não deixa dúvidas dizendo, nos seus vários relatórios e incluindo o seu último  de  2024 sobre “ Qualidade e eficiência nas UCSP[3] e USF“, que “a comparação de indicadores internacionais de qualidade reforçou que Portugal revelava um desempenho acima da média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) … nos indicadores relativos às admissões hospitalares evitáveis” e que, no âmbito do desempenho económico-financeiro, as USF apresentavam um desempenho consistentemente superior às restantes unidades.

Nunca houve tantas USF, nem tantas pessoas seguidas em USF

Nos últimos anos, o setor da saúde em Portugal tem enfrentado mudanças profundas, que exigem políticas baseadas em evidências para garantir um sistema eficiente e sustentável. O sucesso da reforma dos cuidados de saúde primários de 2005, que promoveu a criação de USF, representou uma quebra na estrutura organizacional muito hierarquizada do serviço público e encerra muitas oportunidades de aprendizagem para outras reformas. Nela foram conjugados os princípios da descentralização de poder, da auto-organização e da responsabilização face aos resultados.

A reforma seguiu, ainda, um conjunto de etapas cruciais ao sucesso de qualquer processo de mudança: envolvimento dos profissionais, o que permitiu promover a coesão para um determinado fim; valorização das necessidades e expectativas, com readaptação das estratégias; e consideração das experiências no terreno. Esta reforma reestruturou a organização dos cuidados, promovendo uma cultura de aprendizagem, uma melhor articulação entre os profissionais de saúde, os cidadãos e as organizações e melhorando significativamente a qualidade dos cuidados.

As USF demonstraram resiliência ao longo de diferentes governos e contextos de crise, mantendo-se sempre na linha da frente, como na pandemia, em que mais de 90% dos utentes foram nelas seguidos. Portugal precisa de serviços públicos como este, que sabem funcionar em todo o tipo de condições, ao serviço da população.

No início de 2024 aconteceu um marco histórico, o cumprimento da promessa de terminar com as quotas para a passagem de modelo A para B das Unidades de Saúde Familiar (USF). Foi uma medida há muito reivindicada pela Associação Nacional de USF (USF-AN) que a considerava um pilar central para a melhoria. Apesar de algumas limitações posteriores, a medida recuperou o élan da reforma e contribuiu para o aumento do número de USF, de profissionais e de utentes abrangidos.

Nunca houve tantas USF – 695 – e tantas pessoas inscritas em USF – 7,9 milhões, assim como profissionais a trabalhar segundo este modelo. Estão em USF, neste momento, 4814 médicos de família (eram 4027 em 2022), 4592 enfermeiros de família (4029 em 2022) e 3441 secretários clínicos (2956 em 2022). No total são 14634,6 equivalentes a tempo completo, o maior número de sempre.

Gráfico 1 – Evolução do número de USF (modelo A e modelo B) entre 2006 e 21 setembro 2025.

Esta situação pode ainda melhorar este ano e saudamos aqui o esforço que a Direção Executiva do SNS e as ULS estão a fazer para que as 37 candidaturas a USF atualmente ativas sejam rapidamente transformadas em USF. 2025 é o melhor ano em termos de candidaturas desde 2019 (53). Se todas se concretizarem são mais 300.000 utentes com equipa de saúde familiar numa USF B. É este que deve ser o caminho!

 

Gráfico 2 – Número de USF que iniciaram atividade anualmente entre 2006 e 2025

Subsistem, contudo, dificuldades no acompanhamento das equipas, no recrutamento de profissionais, na sua fixação e na sua mobilidade, na progressão na carreira, na prevenção do burnout profissional e na conciliação da vida profissional, pessoal e familiar – tudo fatores que ameaçam a sustentabilidade do SNS, mas que são controláveis com as medidas certas.

Em diversos comunicados, a USF-AN tem sublinhado a urgência de melhores condições de trabalho e sistemas de informação. A dificuldade em ter horários parciais, a perturbação que o novo modo de incentivar o desempenho – IDE, índice de desempenho da equipa – provoca, a necessidade substituir profissionais em caso de ausências prolongadas, a falta de progressão na carreira, o atual sistema de avaliação de desempenho, a necessidade de abertura de concursos para o ingresso de enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Familiar na categoria correspondente, a inexistência de uma carreira de secretariado clínicos, as baixas remunerações generalizadas são fatores de resolução à distância de um decreto ou de uma orientação.

É este o panorama em que o estudo “O Momento Atual da Reforma dos Cuidados de Saúde Primários em Portugal” alcança a sua 15ª edição a tomar o pulso à Reforma dos Cuidados de Saúde Primários. Este ano conseguiu-se uma taxa de resposta de 77,6% em relação a todas as USF– a 2ª melhor de sempre – e um recorde de respondentes – 538.

Os resultados do estudo vão ser apresentados a 17 de outubro pelas 11h no 16º Encontro Nacional das USF que, este ano, não podia ter melhor título: USF B – Agora, mais que nunca!

O contexto de transformação que temos enfrentado, requer implementação de políticas baseadas em evidências de forma a promover consensos. O SNS, agora sob a liderança de uma nova equipa executiva e ministerial, enfrenta o desafio de resolução de problemas estruturais presentes há muito, por forma a assegurar a continuidade do SNS e os progressos conseguidos desde a criação das primeiras USF.

O Futuro: consolidar, melhorar e avançar

O trabalho da Missão para os Cuidados de Saúde Primários deixou uma marca duradoura: demonstrou que o envolvimento dos profissionais é a base de qualquer reforma sustentável.

As próximas décadas devem consolidar a inovação organizacional, promover carreiras atrativas e garantir que todos tenham uma equipa de saúde familiar próxima, estável e valorizada.

O SNS é fundamental para que todo o País funcione!

E para a vida das pessoas!

 

A Direção da USF-AN

[1] https://diariodarepublica.pt/dr/detalhe/resolucao-conselho-ministros/157-2005-156182

[2] Para saber mais sobre esta reforma, consultar o site da USF-AN aqui.

[3] UCSP – Unidade de Cuidados de Saúde Personalizados, que é a unidade que funciona no modelo anterior às USF, hierarquizado, com menos autonomia, chefias nomeadas sem votação dos profissionais e com menos incentivos, resultado da menor autonomia.