Nos últimos anos, Portugal tem assistido à melhoria dos seus indicadores de saúde, mas também a um conjunto vasto de medidas e reformas com o objetivo de melhorar a eficiência e a eficácia do SNS, das quais se destacam a reforma dos cuidados de saúde primários, com a extinção das cessadas sub-regiões de saúde, a criação dos ACeS e a nova organização dos Centros de Saúde, onde as USF assumem um papel de destaque.
Por outro lado, uma das maiores dificuldades do setor continua a ser a inadequação do modelo organizacional e de gestão, em que o papel tripartido do Estado, de acionista, regulador e pagador, concentrando muitas responsabilidades numa só organização, leva a que seja difícil assegurar um desempenho ótimo na totalidade das funções. A multiplicidade de entidades que participam na regulação do setor, nem sempre com alinhamento, visão e uma clara definição de responsabilidades, acabam por dificultar a implementação de uma filosofia de responsabilização e uma cultura de gestão essenciais ao funcionamento saudável do sistema.
É o caso das ARS, que em cada região, são responsáveis por garantir o acesso das populações à prestação de cuidados de saúde, adequando os recursos disponíveis às necessidades em saúde. Aqui surge mais um desafio. As ARS abrangem áreas de influência enormes, obrigando-se a ter estruturas também grandes e complexas.
A reforma dos CSP extinguiu as sub-regiões de saúde, que até então estabeleciam a ponte entre os centros de saúde a as ARS, com funções essencialmente administrativas. Em simultâneo, foram criados os ACeS, estruturas administrativas, constituídas por várias unidades funcionais, e que agrupam um ou mais centros de saúde.
Assistimos, no entanto, a uma autonomia extremamente limitada dos ACeS no que toca à gestão de recursos humanos e materiais. Continuam os mesmos a estar extremamente dependentes das ARS, que, pela sua dimensão e por serem máquinas burocráticas de enorme complexidade, demoram a dar resposta em tempo útil. Uma intervenção de determinada dimensão ou complexidade numa unidade funcional continua a estar dependente de pareceres, autorizações, homologações, que se delongam entre gabinetes… entre edifícios…. durante semanas…. meses. Impossível gerir a saúde da população e ter profissionais motivados assim!
Veja-se, como exemplo, o organograma da estrutura da ARS Lisboa e Vale do Tejo:
Sem, de todo, colocar em causa a competência e a vontade de fazer bem dos seus profissionais, esta estrutura, por tudo o que acarreta em termos de recursos e dimensão, não consegue gerir, de forma eficaz e em bom tempo, 309 unidades funcionais (já não incluindo os cuidados de saúde hospitalares e cuidados continuados) que cuidam da saúde de mais de 3,5 milhões de pessoas!
Em 2017, no 9º Encontro Nacional das USF, o então Ministro da Saúde, Dr. Adalberto Campos Fernandes, reconheceu que “as ARS resultaram da extinção das sub-regiões e da acumulação de competências com outras entidades, perderam-se no papel e afastaram-se do importante que era estar no terreno, na coordenação, no acompanhamento estratégico e identificação de necessidades”. Aconselhou também as ARS que fazem “menos bem a fazer melhor ou a mudar de vida” e adiantou que, não só estaria a ser preparada um nova lei orgânica para as ARS, como estaria a ser repensado o modelo, que considerou “envelhecido”.
Pois… Mais de um ano volvido… O Sr. Dr. Adalberto mudou mesmo de vida… mas no que toca às ARS… pouco mudou.
Urge repensar seriamente a dimensão dos ACeS, bem como a sua autonomia!
ACeS mais pequenos, mais próximos das suas unidades funcionais e da sua população (cuja grande maioria não faz a mínima ideia do que são e para que servem), com maior capacidade de intervenção e apoio no que toca a política de gestão de recursos humanos e materiais (à semelhança dos EPE). Todos temos a ganhar com isso. Desburocratizar para bem governar.
Pedro Coelho
Secretário da Direção
Secretário Clínico, USF Oriente