Discurso de Bernardo Vilas Boas | Presidente da Direção da USF-AN
Sessão de Abertura do 7º Encontro Nacional das USF
SAUDAÇÃO INICIAL
Saúdo todos os presentes, todos os profissionais de saúde, todos os preletores, todos os convidados, a Universidade e a Cidade de Aveiro.
Saúdo as Comissões Organizadora, Científica e Local, através dos seus Presidentes, João Rodrigues, Manuel Oliveira e José Carlos Marinho, os três jovens colaboradores da USF-AN, os voluntários, enfim, todos os que ergueram e nos proporcionam este extraordinário acontecimento que é o 7º Encontro Nacional das USF.
RESULTADOS DAS USF – A MARCA USF E O SEU EFEITO POSITIVO
Os resultados das USF, publicados e acessíveis ao cidadão, são robustos, são esclarecedores e são inquestionáveis quanto ao seu efeito na criação de mais valor em saúde.
Vejamos alguns números e gráficos, construídos a partir dos dados oficiais, facultados pela ACSS e disponíveis no portal BI|USF (www.biusf.pt).
Saliento esta parceria colaborativa ACSS/USF-AN, promotora de capacidades e potencialidades mútuas.
Este primeiro gráfico é relativo à taxa de utilização de consultas médicas no triénio 2012-2014 e mostra que em 2014 as USF modelo B atingiram 89%.
Continuando na dimensão acesso e analisando a taxa de utilização nas consultas médicas e de enfermagem de Planeamento Familiar, continua a verificar-se a mesma tendência.
Vejam que as USF têm sempre melhores resultados. Isto é verdade quando falamos de todos os indicadores de acesso, da vigilância da criança, da vigilância da grávida, do rastreio oncológico, do acompanhamento de doenças crónicas e dos custos com medicamentos e MCDT.
Os custos com medicamentos nas USF são significativamente inferiores aos custos nas UCSP e esta diferença mantém-se desde 2009.
Assim, os resultados das USF são consistentemente melhores, melhores que os das UCSP, e mostram que o modelo B, ao qual quase todas as USF aspiram, é o estímulo necessário para manter e desenvolver este paradigma de prestação de cuidados.
O estudo de investigação sobre Modelos de Gestão nos CSP, coordenado pela Dra. Ana Veloso, identificou como principais mais-valias organizativas do modelo USF a gestão participativa, níveis elevados de suporte organizacional, níveis elevados de compromisso e coesão afetiva.
Esta investigação mostra que as USF fazem melhor gestão dos seus recursos e são inovadoras. Os utentes sentem-no e estão satisfeitos.
Quanto à satisfação laboral, as USF modelo B são as que apresentam maior nível de satisfação (geral e por dimensão).
AVALIAÇÃO DA REFORMA CSP
Os dados oficiais mostram a diminuição do número de novas USF, o que se verificou particularmente desde 2011, apesar de se continuarem a registar novas candidaturas e de existirem 50 ativas.
Destaca-se que este ano foi alcançado um novo mínimo de sempre – apenas uma nova USF inaugurada nos primeiros quatro meses de 2015 – após cinco anos em que, sucessivamente, foi decrescendo o número de USF que iniciaram atividade.
As USF modelo B iniciaram este processo descendente em 2012, curiosamente quando o Memorando de Entendimento da Troika recomendou o seu aumento, dadas as vantagens que demonstram ter e que já estavam comprovadas naquela altura.
O estudo do Momento Atual, na sua sexta edição, obteve respostas de 74% dos coordenadores das 418 USF existentes, o que significa uma amostra muito representativa, conferindo ao estudo um poder inquestionável.
A taxa de resposta deste estudo mostra que rapidamente se podem auscultar os profissionais e ter a sua opinião para a tomada de decisão – fundamental para que as políticas tenham sucesso no terreno.
Os níveis de insatisfação com a situação atual e com o Ministério da Saúde atingiram os valores mais elevados de sempre. São quase 80% os coordenadores que se consideram insatisfeitos ou muito insatisfeitos com a atuação do Ministério da Saúde (contra 34% em 2009/2010).
Os principais problemas que carecem de resolução nas USF são os sistemas de informação e as aplicações informáticas, em particular no que se refere à falta de integração, lentidão, inadequação à prática clínica e a falhas no acesso (62% das USF ficaram sem acesso mais de dez vezes e destas 27% mais de 50 vezes).
A estas dificuldades acresce a falta ou inadequação de equipamento informático e a falta de material considerado essencial à atividade clínica nas unidades (91% das USF referem ter tido falta de material considerado básico durante 2014, e em 30% destas tal aconteceu mais de dez vezes).
A insatisfação continua com a contratualização, apesar de se terem verificado melhorias em vários aspetos desta. Considerado e bem um processo essencial na atividade das USF, os coordenadores referem a falta de transparência e de equilíbrio na negociação, que ignora especificidades de cada USF.
Relativamente aos recursos humanos, verifica-se uma preocupante diminuição da percentagem de profissionais providos em lugar do quadro e também dos profissionais com mobilidade consolidada.
Um aspeto de importância central é que a grande maioria das USF está contente com a atividade da sua própria USF (75% satisfeitos ou muito satisfeitos) e com a atuação da Associação Nacional de USF (USF-AN).
Verifica-se, como nos anos anteriores, que quase todas as USF têm uma forte participação na formação de vários grupos profissionais, evidenciando o papel fundamental das USF na formação de novos profissionais para os CSP.
Esta situação e o facto de as USF assegurarem, em comparação com os modelos anteriores, um maior número de utentes não só com médico de família, mas com equipa de família (médico, enfermeiro e secretário clínico) e, ainda, prestarem cuidados mais eficientes, torna o desenvolvimento das USF fundamental para que se cumpra a obrigação de disponibilizar cuidados de saúde primários de qualidade a todos os portugueses.
No entanto, as USF – uma inovação portuguesa reconhecida internacionalmente, que trouxe mais qualidade e eficiência ao sistema de Saúde – não estão a ter o necessário desenvolvimento e promoção por parte do Ministério da Saúde.
O que tem acontecido nos últimos anos não é razoável.
O que está em curso não é tolerável.
O projeto para remunerar o aumento exagerado das listas de utentes, sem olhar à acessibilidade, à qualidade e ao papel indispensável de enfermeiros e secretários clínicos, é inaceitável, mais parece um presente envenenado para implodir as USF…
A impossibilidade de as equipas monitorizarem os seus resultados, por incumprimento do MIM@UF/SIARS, é inaceitável e coloca em causa a própria contratualização…
As enormes dificuldades de consultar e estabilizar a medicação crónica dos utentes na PEM (software de “prescrição eletrónica médica”).
Os incentivos institucionais que não são aplicados, o bloqueio ao processo de acreditação, tudo isto é inadmissível.
O defraudar das justas expectativas das USF que há mais de 1 ano têm parecer técnico aprovado e ainda não tiveram a sua candidatura a modelo B homologada. O Ministério da Saúde tem de corresponder às legítimas expectativas e direitos das equipas! Para quando a publicação da portaria?
Não aceitamos pactuar e ser coveiros do que de mais valioso em saúde foi criado: equipas multiprofissionais, com gestão participativa, com autonomia e responsabilidade, com qualidade e eficiência!
FUTURO – NOVO CICLO, NOVA REFORMA!
A situação atual é insustentável, a vários níveis, mas particularmente no que depende do poder político, designadamente, ao nível dos recursos humanos, dos sistemas de informação, do cumprimento de compromissos, da criação de novas USF, da evolução para modelo B de todas as USF que a isso aspirem e que para isso cumpram as condições necessárias.
Só alterando esta situação, com novos apoios, recursos e investimento, com descentralização, com autonomia gestionária e competências nos ACeS, é possível promover as boas práticas clínicas, de saúde e de governação, é possível fortalecer os CSP e melhorar continuamente a qualidade e a eficiência do SNS.
Só esse novo contexto permitirá potenciar e gradualmente generalizar a mudança organizacional e as metodologias de trabalho de equipa.
Neste encontro vamos, como o João Rodrigues já disse, discutir e refletir, sobre aspirações e expectativas, para os próximos 7 anos. Mas vamos definir, de forma amplamente participada, medidas que serão apresentadas à sociedade e às diferentes forças políticas, para pôr em prática já durante o ano 2015/2016.
SAUDAÇÃO FINAL
Em 17 de outubro deste ano teremos eleições para os órgãos sociais da USF-AN. Como informei no Conselho Consultivo e na Assembleia Geral, eu e a Direção que na sua maioria me acompanhou nestes 6 anos, não nos iremos candidatar. Esta é, por isso, a última vez que tenho a honra de falar num Encontro Nacional, como presidente da Direção da USF-AN – obrigado por terem confiado em nós, por nos terem proporcionado este trabalho, esta experiência, esta responsabilidade, esta missão.
A USF-AN foi pioneira ao consubstanciar valores de cooperação multiprofissional, de participação dos profissionais, de prestação de contas e de participação dos cidadãos. Vai continuar a promover este modelo, de uma nova cultura, no seio do Serviço Nacional de Saúde, positiva, criadora de valor, que inclui autonomia, discriminação positiva, responsabilidade e qualidade do serviço público.
Com este Encontro Nacional, com os bons resultados obtidos, com a satisfação das pessoas, com a avaliação e o reconhecimento externo, com este capital humano e com ferramentas como o BI das USF estamos preparados para o futuro!
O futuro só pode ser o relançamento dos valores e princípios da Reforma, iniciando um novo ciclo que responda aos novos desafios. E é isso que estamos a iniciar com este 7º Encontro Nacional, só possível com a V/ enorme e extraordinária participação, possibilitando um acontecimento pioneiro, mágico, e ao mesmo tempo, realista, transformador, garante de qualificação e equidade dos CSP e do SNS!
Muito obrigado!
Bernardo Vilas Boas
14 de maio de 2015, Universidade de Aveiro
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